Alysson Paolinelli, o pai da agricultura no Brasil. Foto: Jefferson Rudy
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Uma das últimas entrevistas do ex-ministro Alysson Paolinelli para um órgão de imprensa de Lavras foi concedida ao jornalista e escritor Diter Stein (foto abaixo), para a revista O Melhor de Lavras, em 2018.
Diter Stein editor do Anuário O Melhor de Lavras, é jornalista, escritor, editor de arte, com passagem pela editora Globo, e realização de projetos especiais para as revistas Veja e Exame. Em Lavras há 18 anos, foi vice-diretor executivo da Faepe (Fundação de Ensino, Pesquisa e Extensão), da Universidade Federal de Lavras (Ufla). No Rio de Janeiro criou a Printz Marketing Editorial que tinha as contas da Petróleo Ipiranga, Gillette, Castrol, IBM entre outras. Foi sócio dos diretores do Ibope e da consultoria norte americana Booz Allen, no Cliquemusic, canal de música brasileira da MSN-Microsoft e UOL. Como escritor recebeu o prêmio de Literatura da Revista Plural do México, criada pelo prêmio Nobel Octávio Paz e foi jurado do Prêmio Portugal Telecom de Literatura de 2010.
Confira abaixo a entrevista do ex-ministro da Agricultura Alysson Paolinelli, para a revista O Melhor de Lavras, de Diter Stein:
"O pai do agronegócio brasileiro
O Brasil é um dos maiores produtores de alimentos do mundo e um dos responsáveis pelo país ter alcançado essa posição é Alysson Paulinelli, estudou no Gammon, na ESAL, foi seu reitor de 1967 a 1961, ex-ministro da agricultura e uma das personalidades à frente da criação da Embrapa e da federalização da Ufla
Até a década de 70, o Brasil importava mais de 30% dos alimentos que consumia. Hoje, é um dos maiores exportadores agrícolas. A passagem de um extremo ao outro exigiu o trabalho de muitos brasileiros. Entre eles, Alysson Paulinelli teve um papel de destaque. Mineiro de Bambuí, formado em agronomia pela antiga Escola Superior Agrícola de Lavras (ESAL), Paulinelli teve forte atuação científica, acadêmica e política. Além de aluno, foi professor, vice-diretor e diretor da ESAL e participou ativamente da federalização da escola, que mais tarde viria a se transformar na Ufla. Em 1971, foi secretário de agricultura no governo de Rondon Pacheco. De 1974 a 1979, no governo de Ernesto Geisel, comandou o Ministério da Agricultura. Durante sua gestão à frente da secretaria e do ministério, Paulinelli esteve à frente de iniciativas fundamentais para o desenvolvimento agrícola do estado e do país, como a estruturação da Embrapa, das Ematers e da Epamig. Como profissional da agronomia, especializou-se no potencial agrícola da região do Cerrado e lutou pelo estudo e desenvolvimento de uma agricultura tropical. Em entrevista a O Melhor de Lavras, Paulinelli, que hoje preside a Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho), conta um pouco desse trabalho.
Como foi a trajetória do desenvolvimento agrícola do Brasil?
Em 1971, quando assumi a Secretaria de Agricultura de Minas, integramos os órgãos ligados à atividade agrícola do estado. Eram mais de 50. Eu queria revitalizar o Instituto Agronômico e disse ao governador Rondon Pacheco que o Decreto-Lei nº 200 permitia criar autarquias especiais no estado e que recriaríamos o Instituto Agronômico como um projeto integrado. Dei inclusive o nome de Programa Integrado de Pesquisa Agropecuária do Estado de Minas Gerais (PIPAEMIG) e convocamos todas as universidades. Financiamos mais de 30 projetos de pesquisa em Minas, em todas as áreas e regiões. Funcionou tão bem que, em 1972, o então ministro da agricultura Cirne Lima disse que gostaria de levar toda a turma de Minas a Brasília para transformar o Departamento Nacional de Pesquisa Agropecuária (DNPEA) em uma empresa também. Nesse ínterim, surgiu a Lei da Empresa Pública, que era melhor que o Decreto-Lei nº 200. Então, realmente levamos o pessoal de Minas, entre eles o Eliseu Andrade Alves, que fez um trabalho belíssimo e é o espírito da Embrapa até hoje. A Embrapa revolucionou toda a agricultura brasileira.
A Embrapa ainda não existia?
Existia uma lei autorizando o poder público a criar uma empresa de pesquisa agropecuária. Nós tiramos a Embrapa do papel. Nos cinco anos do Geisel, fizemos 17 centros nacionais, treinamos profissionais de todas as áreas e eu consegui vaga para mil profissionais para começar a Embrapa. Chamamos universidades, a iniciativa privada e forçamos a criação desses centros. Demos bolsas de estudo e mandamos profissionais para a maioria dos países desenvolvidos em agricultura.
Quando o senhor percebeu a importância dos biomas brasileiros?
Isso foi uma consequência. Mandamos esses profissionais para fora com a incumbência de conhecer a ciência no mais alto grau, mas para aplicar tecnologia e inovação nos biomas brasileiros. Pensávamos no Cerrado, na Mata Atlântica... Eles foram estudar fora, mas ficaram vinculados às atividades da Embrapa aqui. Essa iniciativa deu um salto na ciência brasileira. Foi aí que começou a grande virada. Não tínhamos, até então, nenhum conhecimento de agricultura tropical. Essa agricultura é a mais sustentável e passou a ser também a mais competitiva e ela fortaleceu muito a posição brasileira. Como ministro, o aperto que eu passei foi importar um terço do que o brasileiro consumia.
Com isso, passamos a ser um dos maiores exportadores de alimentos?
Em 40 anos, passamos de importador a exportador. Em volume, já somos o maior exportador de alimentos do mundo. Dizem que o Norman Borlaug (engenheiro agrônomo americano) fez a primeira revolução verde, mas a revolução que realmente resolveu o problema da fome foi a segunda revolução feita aqui no Brasil com a agricultura tropical. Essa agricultura será a salvação do mundo, que caminha para chegar a 10 bilhões de habitantes. Os organismos internacionais apontam que o Brasil terá de suprir com 40% de nova demanda de alimentos. E nós vamos cumprir com esse compromisso.
Qual é a situação do desenvolvimento da agricultura atualmente?
Estou satisfeito porque, nessa crise, estamos começando a remontar um sistema cooperativo, com as universidades, a Embrapa, os institutos estaduais que sobraram e a iniciativa privada. Vamos fazer um programa integrado de pesquisa, um coworking. Traremos pesquisadores de fora para conhecer melhor os biomas brasileiros. Queremos acabar com essa falácia de que o Brasil produz alimento à custa de seus recursos naturais. É o contrário. Somos o único país do mundo que está recuperando áreas degradadas, produzindo e competindo.
Como o senhor vê a evolução do agronegócio aqui em Lavras e na região do Campo das Vertentes?
Tenho acompanhado com muito carinho a evolução do agronegócio na região que já era um grande centro de produção de café e de produção de pesquisas e criação de novas tecnologias para o agronegócio. A integração dos produtores de Lavras e cidades vizinhas com essas novas tecnologias está transformando a região em um eficiente centro produtor de outras culturas como da soja, do trigo, aveia, milho e feijão. A utilização dessas novas tecnologias, como agricultura de precisão, rotação de cultura etc, mais o centro gerador de tecnologia que Lavras se tornou e a criação do Lavras Tec, vai despertar a atenção do que pode acontecer aí na região.
O senhor acredita que o boom do agronegócio aqui na região pode trazer novas empresas a se instalarem aqui, como recentemente aconteceu com Rehagro, que transferiu a sua empresa para Lavras?
Acredito e a chegada destas empresas, além de aquecer a economia local, pode gerar muitas mudanças. A Rehagro, por exemplo, tem feito um trabalho belíssimo e de grande importância para nosso agronegócio, em consultoria, assistência técnica, gestão, preparação de mão de obra, etc. Sou fã do trabalho desenvolvido pela Rehagro, e acredito que ela pode contribuir muito no desenvolvimento do agronegócio na região.
Diter Stein sendo entrevistado por Jô Soares no programa Jô Onze e Meia, na Rede Globo de Televisão